Desde os anos 80, o PT talvez seja a sina, o carma e a musa
da esquerda brasileira. Ou parte dela. Primeiro, como símbolo da luta
trabalhista, de uma guinada ao “socialismo” (mesmo que moderadíssimo – se é que
isso existe –, como visto algum tempo depois, com políticas centristas), de uma
liderança sindical no poder executivo, algo impensável naquele momento, ainda
mais em um Brasil pós-ditadura militar.
Depois, como uma real possibilidade do país se ver, pelo
menos em partes, longe de políticas essencialmente neoliberais, como as
privatizações, ou que atingissem aos direitos trabalhistas. O PT era a esperança
de um povo que até ali era miserável, tanto em questões econômicas como também
de amparo.
Muito foi feito, admitamos. Lula foi um grande presidente, como
ícone e gestor. Soube articular, mesmo que não seguindo os preceitos mais dignos
da moral, seus apoios e o que era necessário para fazer o que queria. Fez. E
muita gente gostou, elogiou, abraçou a ideia. Muita gente não – muitas vezes
porque incomodava o próprio bolso. Ou a própria ética.
Depois veio Dilma, a sucessora forçada de Lula, que se viu
sem opções para seu trono. O PT continuando na área, com o slogan seguindo literalmente à risca o que estou expondo: “Renova a esperança”. Era a
expectativa de todos – inclusive a minha, mesmo com alguns pés atrás.
E Dilma Rousseff se mostrou uma má administradora. Isso foi
claro. Mesmo com sua honestidade, sinceridade e toda a sua personalidade e
entusiasmo. E todas as suas péssimas decisões enquanto presidenta,
acrescentadas à sua grande teimosia e incapacidade de articulação, permitiram
aos “cobrões” de sempre, e pra sempre, enxergarem uma bela estrada até o poder.
Claro, todo o processo de volta aos 90 (80, 70...) e a
iminência de se perder todo o pouco que o PT fez e podia fazer, não ocorreu
antes do próprio PT fazer isso. O Partido dos Trabalhadores se tornou de
centro, e nos últimos anos tem virado, deliberadamente, as costas para aqueles
que os puseram e os mantiveram no poder. Não estou dizendo que a vida de Dilma
enquanto chefe do Executivo foi fácil – e ela até impediu coisas piores de
acontecer –, mas não pode se considerar como “governo de esquerda” uma gestão
que enriquece banqueiros, que faz conchavos cada vez mais profundos com
empresários, e que vende a alma tão barato a outros sanguessugas, como tem
ocorrido nos últimos 6 anos.
E com o Golpe de Estado quase sacramentado, a posição do
partido e da presidenta quanto à situação são absolutamente deploráveis.
Primeiramente, em um momento em que todos assistiram aos mesmos ratos com que o
PT se juntou, unindo-se para abocanhá-lo, é decepcionante não ver o partido se
voltar para aqueles que sempre estiveram ao seu lado. Não mudaram as políticas
de direita, não abraçaram os movimentos sociais e a ruas, não tentaram nada.
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Foto: Divulgação |
Onde está a caminhada pelo Brasil que Lula prometeu fazer
logo depois que foi tomado de assalto pela Polícia Federal? Dilma, então,
balbucia aqui e ali um tímido “É Golpe!” em reuniões mais, digamos,
particulares e intimistas, mas quando chega à ONU, frente a líderes mundiais,
cujos países vêm denunciando o atentado contra a democracia que o país vem
sofrendo, a presidenta recua com um discurso frouxo e broxante.
Quem vem defendendo a democracia e pedindo a saída dos
arquitetos do Golpe (Cunha, Temer, Mendes etc.) é a própria esquerda contra a
qual o PT virou a face. E não me refiro àqueles que vivem pensando fora da
caixinha e bradando por causas absurdas. Posso até mesmo citar aqueles que só
queriam uma reforminha no sistema em um cantinho ou outro.
É de conhecimento pleno de quem exerce o senso crítico de
que Michel Temer e sua trupe irão sucatear o país. A tal ponto que as pessoas
irão sentir falta do PT. Será essa omissão uma estratégia para vir forte nas
eleições de 2018, como contraponto a um Governo que, apesar de apoiado por
diversos setores influentes da sociedade, consegue ser mais desastroso ainda –
ou em eventuais Eleições Gerais antes disso?
Se sim, o PT mostra o que se tornou. Mais um dos peões
desse jogo de xadrez que começa e termina dentro do Palácio, e que em nenhum
momento lembra das ruas e de seu povo – apenas quando é conveniente. É o touro
que se finge de morto frente ao desalmado toureiro para se vingar em seguida, e
não o que luta até a morte e busca a vitória apenas pelo fato da causa ser
nobre e muito maior do que o triunfo em si. A esperança que antes só aguardava
sua renovação, agora aguarda a eterna guinada à esquerda que nunca saiu e nem
deve sair. Não esperançou, esperou. O vermelho desbota. Do PT e do Brasil.